sábado, 30 de julho de 2016

O SEGREDO DOS SEUS OLHOS (2006)

Um funcionário público

O SEGREDO DOS SEUS OLHOS (El Secreto de Sus Ojos / 2009) - Já faz um tempo que o cinema argentino é visto com bons olhos. E é impossível não olharmos nesse momentos para o nosso próprio cinema. E no quesito sucesso internacional a gente leva de goleada. O Brasil concorreu 4 vezes ao Oscar de melhor filme estrangeiro - O Pagador de Promessas, O Quatrilho, O Que é Isso, Companheiro? e Central do Brasil - sem nunca levar. Os hermanos levaram dois prêmios com La Historia Oficial de 1986 e este O Segredo dos Seus Olhos.

O Oscar de melhor filme estrangeiro para o longa argentino

Os primeiros 40 minutos do longa dirigido por Juan José Campanella - que já havia concorrido ao Oscar de melhor filme estrangeiro com O Filho da Noiva de 2001 - não fazem jus à trama que se desenrola dali pra frente. Eles contam a história de Esposito (Roberto Darín), um funcionário de um órgão público, que 25 anos depois, ainda se sente atormentado por um crime de estupro seguido de morte que ele e seu colega Sandoval, não conseguiram resolver. Esposito está escrevendo um romance do caso e a culpa o deixa perturbado.

Uma equipe em busca de um criminoso

Até aí nenhuma virada surpreendente. Isso até o minuto 40 com uma das mais belas cenas de um (quase) plano sequência (quase porque tem alguns cortes aqui e ali) que eu já vi no cinema. Começa com uma imagem aérea do estádio do Racing durante um jogo, a cena acompanha um lance que quase sai gol e acaba no meio da arquibancada com Esposito e seu companheiro atrás do criminoso. A cena se estica para uma perseguição implacável e acaba (!) dentro de campo. Se você não conhece, veja abaixo. É espetacular (vale a partir dos dois minutos, ok?)



Daí pra frente, além da trama principal são criadas uma série de outras paralelas que abrem várias possibilidades. Neste ponto descobrir o criminoso é o de menos, o filme desponta uma gama de personagens e situações cada vez mais complexas. É aí que O Segredo dos Seus Olhos se destaca, um filme que precisa ser visto e revisto e reserva uma cena final impressionante, que ajuda a amarrar todas as pequenas tramas. Nenhum ponta fica sem nó.

Uma paixão de décadas
Não dá para revelar muita coisa da história, afinal aí está a sua graça. Tem que assistir, tem que conferir para se surpreender. Veja abaixo o trailer de O Segredo dos Seus Olhos.

   

terça-feira, 26 de julho de 2016

APERTEM OS CINTOS O PILOTO SUMIU (1980)

O piloto automático

APERTEM OS CINTOS O PILOTO SUMIU (Airplane! / 1980) - Se você riu muito com Top Secret, Corra que a Polícia Vem Aí, Top Gang, Todo Mundo em Pânico, por exemplo, saiba que aquelas loucuras todas se iniciaram por este filme - Apertem os Cintos o Piloto Sumiu. Não apenas isso. O filme foi responsável por revitalizar uma nova vertente, a da comédia do absurdo - com cenas acontecendo no fundo da principal e muitos trocadilhos infames. Herança do gênio Mel Brooks, com filmes como Banzé do Oeste, por exemplo.

Um avião desgovernado

Apertem os Cintos o Piloto Sumiu é dirigido e roteirizado pelos irmãos Jerry e David Zucker e por Jim Abrahams. O primeiro acerto deles neste filme - e olha que foram muitos - foi trazer atores sérios que nunca tinham feito comédia antes, como Lloyd Bridges e Leslie Nielsen. A expressão fechada dos dois velhotes, como que se levando a sério o tempo todo é o que faz seus personagens - um chefe de polícia e um médico respectivamente - tão hilários.

Lloyd Bridges...

... e Leslie Nielsen, dois atores se aventurando na comédia. E com sucesso!

O roteiro gira em torno de um vôo onde subitamente as pessoas começam a passar mal, devido a comida servida estar estragada. O piloto também passa mal. Cabe a um ex-membro da força aérea americana deixar seu assento e pousar a aeronave. O problema é que ele precisa obedecer as regras passadas pela torre de comando - um ex-chefe com quem teve problemas no passado.

Torre de controle fora de controle

Um médico tenta manter tudo sob controle no ar, enquanto as pessoas - uma a uma - vão perdendo sanidade devido a queda iminente do avião. O piloto automático é chamado para ajudar em alguns momentos, mas nem ele parece dar conta do recado.

O piloto automático se diverte, mesmo com o avião caindo

Num filme assim os elementos básicos da trama - como o começo, o meio e o fim - não são lá muito importantes ou relevantes. É desnecessário dizer que o avião pousa em segurança no final e todos se salvam. Isso não importa na verdade. Num filme como Apertem os Cintos o Piloto Sumiu o mais importante é a jornada até que isso aconteça, as gafes, os momentos e as risadas que aparecem aqui e ali. E são muitas.

Será que cai este avião?

Enxuto e nonsense. Apertem os Cintos o Piloto Sumiu faz piada com tudo desde religião, imprensa marrom, preconceito racial, além de muita comédia física, maquetes propositalmente mal feitas e o clássico cocô no ventilador. Uma jornada que vale a pena.

"O pessoal sabe mexer nos instrumentos..."

Vejam abaixo o trailer de Apertem os Cintos o Piloto Sumiu.


quinta-feira, 14 de julho de 2016

INTERESTELAR (2015)

A viagem espacial começa... numa fazenda no meio do nada

INTERESTELAR (Interstellar / 2015) - Poucos filmes nos últimos tempos me deixaram tão intrigado quanto A Origem. É difícil acreditar que um roteiro absurdo de tão espetacular e com uma ideia completamente inovadora - mesmo que bebendo em inúmeras fontes aqui e ali - seja original. Tudo piração da mente perturbada de Christopher Nolan. Se você ainda não viu A Origem, pare de ler agora esse post, e vá assistir!

"A Origem", um clássico instantâneo

Nolan assina também o roteiro e a direção de Interestelar, uma ficção científica difícil, complicada e intrincada. E nem faz questão de ser diferente, nem precisa. A história se passa em um ano ignorado num futuro onde as esperanças de sobrevivência da raça humana estão diminuindo devido ao gasto de todos os recursos naturais do planeta. Cooper (Matthew McConaughey) é um engenheiro espacial aposentado e pai de duas crianças que vive com o sogro em uma fazenda no meio do nada, onde plantam milho para sobreviver.

Pai e filha - obstinados e orgulhosos 

Ele acaba encontrando por acaso, ao lado da filha, uma base ultra secreta da Nasa e umas pessoas que tem um plano mais do que ambicioso - encontrar um planeta com condição de receber a vida humana. Esse outro planeta fica próximo a Saturno. Cooper é convencido a ser o piloto da expedição.

O piloto da expedição

Perto desse planeta tem um "buraco de minhoca", que seria uma espécie de um caminho que leva à quebra da barreira espaço-tempo. Lá dentro nada é como conhecemos. Parece confuso. E é. Muito! A equipe de exploradores é formada por Cooper, Amelia Brand (Anne Hathaway), filha do idealizador de toda a viagem, o professor Brand (Michael Caine) e mais dois outros exploradores. Em meses (tempo terrestre) a expedição passa pelo "buraco", navega por outra dimensão e chega até outro planeta.

Passos pelo desconhecido

Interestelar não é só isso, aliás longe de ser. É na meia hora final que o filme é alçado do status de filme comum sobre ficção científica para algo muito maior, grandioso, digno de cult. Diria, sem medo de errar, que Interestelar significa para esta geração o que 2001 - Uma Odisséia no Espaço de Kubrick significou para amantes de cinema e ficção científica em 1968.


2001 e Interestelar - duas histórias impressionantemente próximas
Calma, não é exagero! A meia hora final do clássico de Kubrick que usa bastante o tal monolito negro era incompreensível para mim... até hoje. Depois de Interestelar a compreensão do significado daquele símbolo ficou até mais clara! Aquilo, a meu ver, nada mais é do que a quebra da barreira espaço-tempo por conta de uma jornada sem igual a outra dimensão. Lá nada é do jeito que é, o tempo não passa da mesma forma, a vida não envelhece do mesmo jeito e é por isso que o personagem do Dr. David Bowman se vê em outras fases da própria vida.

Passagem das fases da vida representada pelo monolito

É mais ou menos o que acontece com Cooper quando ele atinge essa outra dimensão. Ele consegue se comunicar com o passado sem ser visto, mas estando lá fisicamente. De camarote ele assiste a fatos da própria vida e influencia no próprio passado... ou seria presente? É incrível, inexplicável e simplesmente fantástico.

Circulando Saturno...
...e caindo numa outra dimensão
Sorte dos amantes do cinema que podem viver no mesmo período que um gênio chamado Christopher Nolan - que já entregou obras primas do calibre de Amnésia, a trilogia Batman (embora não goste muito do terceiro filme) e A Origem. Esse cara tem ideias mirabolantes, originais e com uma direção impecável que vai colocar seu nome entre os grandes mestres do cinema logo logo. Escreva aí.
Veja abaixo o trailer de Interestelar.



quinta-feira, 7 de julho de 2016

A DOCE VIDA (1960)

A cena mais famosa de A Doce Vida

A DOCE VIDA (La Dolce Vita / 1960) - O lado exótico da sociedade italiana sempre foi o grande atrativo no cinema de Federico Fellini. Seus filmes tem um olhar todo especial para este tipo de abordagem, tanto das pessoas como das situações. O convencional não costuma ter muito espaço nas obras do diretor. A Doce Vida, seu filme mais festejado, não poderia trilhar outro caminho.



Marcelo Mastroiani, a alma do longa de Fellini

O personagem central de A Doce Vida é o jornalista Marcello, vivido por Marcello Mastroianni. Ele passa seus dias atrás de histórias dos personagens e de eventos que acontecem em Roma. Uma dessas cenas, aliás a que abre o filme, é um transporte via helicóptero de uma imagem de Jesus Cristo dando uma panorâmica - sem igual para a época - da capital italiana.

Um fotógrafo à procura de um sentido


Marcello segue para o aeroporto cobrir a chegada de uma atriz internacional. Ele leva seu fotógafo, Paparazzo. Ele, ao lado dos demais fotógrafos, estão sempre em todos os lugares. Aparecem, praticamente, em cada cena do filme. São irritantes, invadindo a privacidade das pessoas, fotografando tudo, mandando nas celebridades - "faz assim", "vire aqui", "olhe ara nós", "tire os óculos" e por aí vai. Não foi à toa que o amigo de Marcello batizou os intrometidos fotógrafos dos jornais sensacionalistas do mundo todo.



Paparazzi


Mulherengo e egocêntrico. São boas definições para Marcello. Ele namora com Emma, mas transa com Madalena nas primeiras cenas do filme. Tem ainda um passado com a garçonete Fanny e um flerte de poucos dias com uma atriz sueca, Sylvia. Vivida por Anita Ekberg, Sylvia é desinibida, está em Roma atrás de diversão e não se incomoda de usar roupas que mostram demais. Seu jeito espontâneo atrai Marcello. Foi ela que em uma madrugada resolveu se banhar na Fontana Di Trevi, propiciando a cena mais icônica de todo a carreira de Fellini e certamente uma das mais reconhecidas cenas do cinema mundial.

A icônica cena sendo filmada


Ao mesmo tempo, Marcello se apaixona e perde o interesse facilmente. Em determinado momento, ele se cansa da sua vida de jornalista e passa a desejar a vida que um amigo seu leva - rico, com esposa e filhos, e amigos interessantes. Marcello recebe a visita do pai, com quem nunca foi próximo, e ele busca se aproximar de toda forma, mas acaba rejeitado.



A vida errante de um fotógrafo


Uma tragédia em seu ciclo de amizade e a perda de contato com todos os seus casos amorosos, faz com que Marcello mude totalmente de vida. Ele larga o jornalismo e passa a promover festas extravagantes, verdadeiras orgias, regadas a drogas e bebidas. Seus amigos são ricos e só querem saber de curtir, sem preocupação com as consequências.



A festa nonsense

O filme carrega por quase três horas uma crítica das mais ferozes à parte da sociedade italiana decadente do pós-guerra e é justamente por esta coragem que A Doce Vida ganhou tanto reconhecimento. As pessoas retratadas aqui são descartáveis, rasas e inconsequentes e, claro, ricas, bem de vida. Marcello, ao invés de combater, se junta a elas no final. É a quebra de qualquer mensagem edificante que o filme poderia ter, um recado claro - "as coisas estão ruins, as pessoas estragam nossa sociedade e se você pudesse também se juntaria a elas".



Uma festa pra lá de animada


O roteiro de A Doce Vida não é nada linear ou convencional. Ele é montado em blocos quase independentes. Em cada um deles conhecemos novos personagens, os anteriores são (boa parte) ignorados, como se nunca tivessem existidos. Formam lacunas. Algumas pessoas aparecem do nada e são super importantes e aquelas que a gente quer levar pra sempre saem da nossa vida de uma hora para outra. A nossa própria vida não é assim?



A década de 60 retratada pelo cinema italiano


Mais do que um filme, A Doce Vida se tornou um marco, é um monumento que representa a força do cinema italiano na década de 60. Um filme que marcou a transição do cinema neorealista italiano para o simbolismo, com os seus paralelos traçados como a crítica a sociedade da época e ao modo como a juventude do pós guerra estava perdida e superficial. O problema? O filme é demais, tirar 40 minutos dali não faria falta nenhuma.
Veja abaixo o trailer de A Doce Vida.





domingo, 3 de julho de 2016

TRUMBO: LISTA NEGRA (2015)

Um escritor de mão cheia

TRUMBO: LISTA NEGRA (Trumbo / 2015) - Uma cinebiografia de uma das personalidades mais controversas da Hollywood dos anos quarenta - Dalton Trumbo. Um roteirista de enorme sucesso, vencedor de dois Oscar. Dono de uma personalidade forte e uma inclinação política que te trouxe muitos problemas. Trumbo era comunista convicto.

Irreconhecível, Trumbo é fichado 

Bryan Cranstron vive Trumbo e é impecável na construção de um personagem controverso e cheio de manias, a principal delas - escrever seus roteiros na banheira de casa dentro da água. Um suporte nas bordas da banheira deixava a máquina de escrever apoiada à sua frente e ao lado uma caneta, tesoura, cinzeiro e outros itens. Ele transformava o banheiro em seu próprio escritório.

O real e o do cinema, escrevendo na banheira
Trumbo vivia rodeado de amigos, entre roteiristas e diretores, todos também comunistas, um grupo que ficou conhecido como Hollywood 10. O grupo foi intimado a depor em 1947 sobre possíveis relações com partido comunista. Não negaram nem afirmaram qualquer afiliação, mas se colocaram, radicalmente contra a inquisição, usando palavras duras perante os microfones. Foram presos.

Sem meias palavras no tribunal

O período na cadeia só serviu para Trumbo e todo o resto fortalecer seus pensamentos políticos. Ao serem liberados eles sofrem na pele o que é ser comunista naquele período politicamente conturbado. Passam a ser boicotados, nenhum estúdio contrata o trabalho deles. A saída criada por Trumbo é usar pseudônimos.

Os seus roteiros, mesmo com pseudônimo, seguiram sendo filmados - sempre com sucesso

Dessa forma, Trumbo escreveu A Princesa e o Plebeu e levou o Oscar de roteiro em 1953. Festejou em casa com os filhos e a esposa. Seu nome voltou a circular com força entre os pequenos estúdios. Trumbo aceitou um trabalho menor num estúdio pequeno como revisor de outros roteiros. para isso ganhava uma mixaria. Concertando uns e fazendo outros, ele fez o pequeno estúdio - comandado por John Goodman - crescer.

O produtor que fez Trumbo voltar às telonas

Escreveu ainda, a pedido do próprio ator principal Kirk Douglas, o roteiro de Spartacus, grande sucesso que levou 5 Oscar. Foi procurado também pelo diretor austríaco Otto Preminger. Tudo isso é retratado no filme. Atores interpretando grandes personalidades do passado conferem um charme todo especial e deixam Trumbo um filme ainda mais rico.

Os atores e as personalidades retratadas - um dos charmes do filme

Eu sou consumidor assíduo de qualquer material- em especial livros - que abordem os bastidores da história do cinema com detalhes de filmes, atores, diretores, grandes estúdios e etc. Trumbo é muito disso. É um filme que vai além de uma cinebiografia bem feita e aborda muito bem detalhes desconhecidos dos bastidores.

Trumbo e a maior fã - sua mulher

Bryan Cranstron tem uma carreira sólida na TV pela série Breaking Bad. No cinema ele ainda está "engatinhando" no que diz respeito a uma busca de identidade. O seu trabalho em Trumbo é notável, ainda mais pela dificuldade que é interpretar um personagem real, que existiu e não lhe dar uma carga exagerada ou caricata, o que causaria revolta de amigos e familiares.

Cranstron em mais uma grande atuação
O filme é simplesmente notável. Mas tem outro ponto muito forte - vale muito pela carga histórica que ele tem, pela ótima construção de época e por Cranstron, um grande ator.
Veja abaixo o trailer de Trumbo: Lista Negra.