sexta-feira, 27 de abril de 2018

BOI NEON (2015)

Um vaqueiro com a cabeça lá longe

BOI NEON (2015) - Gabriel Mascaro está tentando cavar seu espaço no cinema nacional. O jovem pernambucano se especializou em documentários desde 2008 e acabou na ficção, mas não abandonou o passado. Muitas das cenas de Boi Neon - seu segundo longa de ficção e de longe seu filme mais premiado - são documentais. Chegou a levar até o prêmio de melhor filme no Festival do Rio. O auge? Mascaro foi eleito o melhor diretor por Boi Neon em um festival de Marrocos e recebeu a estatueta das mãos de Francis Ford Coppola. Bom começo hein?

Mascaro recebendo prêmio das mãos de Coppola...
...e ostentando o troféu

Boi Neon conta a história de uma equipe que vive peregrinando no sertão de Pernambuco promovendo vaquejadas, festival muito popular em vários estados brasileiros onde uma das principais atrações é o momento em que dois cavaleiros derrubam um boi segurando-o pelo rabo. Iremar (Juliano Cazarré) é um dos vaqueiros que preparam os bois antes de entrar na arena.

Um abraço no sertão

Galega, mecânica e motorista de caminhão, é a única mulher adulta por ali. A sua filha Cacá também enfrenta o dia a dia naquele meio, embora viva de mau humor característico da pré adolescência. O pai dela abandonou a família e agora a criança fica colada à mãe ajudando na vaquejada.

Galega

Iremar de vez em quando, segue pro lixão da cidade recolhendo roupas, acessórios e até manequins. Tudo para ajudá-lo no seu maior sonho - se tornar estilista. Ele pega as revistas de mulher pelada de um amigo vaqueiro e lá desenha seus modelitos. O sonho de mudar de vida fica difícil com a rotina puxada. Mas ele acaba por se envolver com uma segurança de uma fábrica de tecidos e consegue entrar lá para conhecer o espaço. E... fim.

O envolvimento do vaqueiro com uma vendedora de perfume

Pois é, Boi Neon pode ser premiado aqui e acolá, mas sofre de um grave problema - falta de história. Nada acontece. Os personagens não vão a lugar nenhum, apenas andam de lado e o filme, com isso, rasteja. As cenas de vaquejada, dos bois em preparo, da região toda de seca nordestina... claro, tudo é muito bonito, mas cinema não é só imagem, tem que ter roteiro e faltou aqui. E pior. Mascaro achou que seria interessante colocar umas cenas intensas de sexo e nudez sem cortes. Algo que não acrescenta absolutamente nada pra história e só atrasa o filme.

Cena longa e, para a trama, desnecessária

O que mais chama a atenção em Boi Neon é o fato de em um ambiente praticamente todo masculino um homem querer sair dali para fazer seu sonho se tornar realidade. Mas em nenhum momento, ele parece mesmo lutar por aquilo, parece mais na base do "se rolar rolou".

Iremar e seu sonho de ser estilista

O filme nem chega perto de discutir essa escolha ou de pelo menos mostrar o personagem caminhando na sua decisão... nada. As fraquíssimas motivações de cada personagem caminham a passos de formiga e chegam no final do longa exatamente no mesmo lugar que começaram. Um desperdício enorme de um bom argumento. Pena.
Veja abaixo o trailer de Boi Neon
  

terça-feira, 24 de abril de 2018

PATTON - REBELDE OU HERÓI? (1970)

Motivo de orgulho ou uma pedra no sapato?

PATTON - REBELDE OU HERÓI? (Patton / 1970) - Reconhecidamente um rebelde. De opiniões fortes e avesso à aparições públicas. Não media as próprias palavras, gostava de beber - se envolvendo inclusive em algumas brigas por conta disso. Em suma, era um cara difícil. Mas de muito talento. Tudo isso serviria para descrever George, seja Patton - o famoso líder do exército norte americano na segunda guerra mundial - ou C. Scott, o ator. Talvez por isso Scott tenha sido a escolha perfeita para encarnar o papel título do clássico filme de 1970.

O verdadeiro Patton

O roteiro, escrito por Francis Ford Coppola, venceu o Oscar. Uma das sete estatuetas que o filme levou, além de diretor para Franklin Schaffner e melhor filme. E claro, a de melhor ator para George C. Scott, mas o rebelde ator se recusou a receber o prêmio por achar que ele transforma os atores em "mercado de carne", enquadrando-os como em um molde. Abaixo o momento em que um representante do estúdio recebeu a estatueta no lugar de Scott na premiação em 1971.


Patton começa de cara com a clássica cena do general discursando com uma enorme bandeira dos Estados Unidos no fundo. Ele fala direto ao seus comandados que estão prestes a se lançar em solo europeu durante a segunda guerra mundial, mas os soldados nunca são mostrados. De cara percebemos que o general é pra lá de linha dura.

Linha dura 

A trajetória de Patton no exército é uma reta ascendente. Seus pensamentos conservadores e nacionalistas guiam seus ideais e o fazem atropelar todos os mandos e desmandos que recebe, e quase sempre se provam escolhas certas que o levam ao sucesso. Sua companhia - o terceiro exército - avança contra todas as condições contrárias graças a mão de ferro do comandante irredutível e boca dura.

Repeitado e odiado, mesmo entre os colegas de alta patente

Só que Patton também enfrenta problemas, principalmente quando as suas atitudes passam a desagradar os altos comandos do exército. Para eles, a instabilidade emocional de Patton traz mais prejuízos do que benesses, como na cena em que ao invadir a Itália ele se vê preso numa ponte com um morador da região e seus dois burros bloqueando a passagem. Patton tira a arma do coldre, mata os animais e os joga ponte abaixo para que seus homens prossigam viagem.

Lendas dizem que os animais foram mortos de verdade para fazer a tal cena

Nesse ponto o sub-título brasileiro é muito feliz - o cara é um rebelde, mas também um herói e durante todo o filme ficamos nos perguntando em qual momento teremos certeza de qual das características se aplica mais a Patton. Pois é... nenhuma. Ele foi um herói de guerra lutando pelos ideais em que acreditava, mas foi um rebelde que causou inúmeras mortes no jogo sangrento da guerra.

Presença Intimidadora

Patton foi tão vilão e assassino quanto qualquer outro, não importa o quão diferente o nacionalista filme de Schaffner tente fazer ele parecer. Patton fez sucesso entre o público mais conservador, como os velhinhos da Academia que viram na derrocada de Hitler o ponto decisivo na "vitoriosa" campanha militar do general norte americano. Mas boa parte do público naquele final dos anos 60 e começo dos 70, não caía mais de gaiato naquele discurso pró-guerra.

Um discurso pró-guerra que não caiu muito bem naquele período

Ficam as boas cenas de guerra com uma quantidade absurda de figurantes e material cenográfico, além de efeitos práticos que só dão valor ao filme. Sem falar na interpretação de Scott, que não apenas o transformou no exemplo do típico militar durão - assim como R. Lee Ermey depois de Nascido para Matar - mas que levou Scott ao panteão dos grandes atores de Hollywood. Pena que ele não queria nada disso...
Veja abaixo o trailer de Patton - Rebelde ou Herói? 


sexta-feira, 13 de abril de 2018

TERRA DE NINGUÉM (1974)

Amor acima de tudo

TERRA DE NINGUÉM (Badlands / 1974) - A estreia. Em todos os sentidos. Terrence Malick escreveu, produziu, dirigiu e atuou em Terra de Ninguém pela primeira vez. Ele tinha 30 anos de idade e já mostrava ali algumas marcas que levaria pra sempre - o questionamento sobre o estado das coisas, os momentos filosóficos de repensar a própria existência e importância no mundo.

Malick não só dirige como tem um papel relevante no filme

A ideia para o roteiro de Terra de Ninguém Malick tirou da vida real - a história é baseada na vida e morte de Charles Steakweather que matava sem critério apelas pelo próprio prazer. Entre o final de 1958 e o comecinho de 1959 ele matou 11 pessoas que cruzaram o seu caminho, inclusive toda a família da namorada, que continuou ao lado dele mesmo depois da matança. Steakweather foi condenado à cadeira elétrica aos 20 anos e baseou, além de Terra de Ninguém, o rapaz do casal protagonista de Assassinos por Natureza.

Kit

Kit (o estreante na telona Martin Sheen, que faria no final daquela década Apocalipse Now), trabalha como lixeiro em uma cidade perdida no meio-oeste dos Estados Unidos. Acaba sendo demitido pelo seu jeitão largado e despreocupado demais. Lembra James Dean. E é isso que chama atenção de Holly (a também estreante Sissy Spacek, que estrelaria pouco tempo depois Carrie - A Estranha) que se interessa pouco a pouco pelo rapaz.

A solitária Holly

O casal começa a se conhecer melhor - ele boca dura, decidido do que quer e ela, menina ainda, tipicamente interiorana, simples e que acaba realizando tudo o que Kit quer. O que irrita o pai da moça. Mas isso não é problema para Kit, que quando vai confrontar o velho depois que ele impediu os dois de se verem, o jovem simplesmente saca uma arma e dispara contra o pai da namorada, que cai morto no chão. Ele bota fogo na casa e foge com Holly, que aceita tudo com estranha passividade.

Em chamas a velha vida fica pra trás

Sem destino certo, o casal pega a estrada e no caminho mata qualquer um que atrapalhe a jornada, sem dó. Holly assiste enquanto Kit executa. Ela não parece entender em nenhum momento tudo o que aquilo representa. Ao todo são cerca de 10 mortes até que a polícia finalmente consegue colocar as mãos no casal.

Matar... uma banalidade pro casal

Durante a jornada de Terra de Ninguém a narração que se ouve é de Holly, o tempo todo, como se tivesse nos contando a história. Tudo no tempo passado, como uma vaga lembrança dela. E ali nada de julgamento sobre as atitudes frias e impiedosas do namorado. Chocam a destreza e a frieza de Kit, que acaba condenado à cadeira elétrica, assim como Steakweather foi na vida real.

O refúgio antes da captura

Uma estreia consistente de Terrence Malick, que fez uma ponta no filme. E em alguns momentos temos aqui aquelas discussões existenciais que Malick tanto gosta como fez em trechos de Além da Linha Vermelha e durante todo o Árvore da Vida.

Vidas violentas e questões existencialistas

Veja abaixo o trailer de Terra de Ninguém.

sexta-feira, 6 de abril de 2018

BAIXIO DAS BESTAS (2006)

Dira Paes na cena-cartaz do filme

BAIXIO DAS BESTAS (2006) - Desde 2000 o estado do Pernambuco vem ganhando força no cenário cinematográfico nacional. Não só pelo lançamento de obras importantes e premiadas internacionalmente, mas também por ser o berço de nomes relevantes para a nossa sétima arte, como Marcelo Gomes de Cinema, Aspirinas e Urubus, Kleber Mendonça Filho de O Som ao Redor e Aquarius, e Cláudio Assis de Amarelo Manga e deste Baixio das Bestas.

Uma das muitas cenas fortes do longa

Zona da mata de Pernambuco. Um cidadezinha não citada é um retrato de pessoas e situações das mais absurdas no que se diz respeito a abuso e violência moral e sexual. Seu Heitor (Fernando Teixeira) é um avô que leva toda semana - mais de uma vez se preciso for - sua neta de 16 anos Auxiliadora (Mariah Teixeira) para ser "apreciada" pelos caminhoneiros num posto de gasolina de beira de estrada. O velho recebe da dona do posto que com essa "atração" recebe mais visitantes.

O avô leva a neta pros fundos do posto

Cícero (Caio Blat) é um jovem bem de vida que estuda no Recife e volta de vez em quando para casa na pequena cidade. Nessas voltas, gasta suas noites e madrugadas com os amigos, principalmente Everardo (Matheus Nachtergaele), bebendo, se drogando e fazendo arruaça. Um dos passatempos prediletos é ir a uma casa de prostituição que tem Dora (Dira Paes) como uma das empregadas.

A casa de prostituição

As histórias é claro, se cruzam. E Auxiliadora que é calada, tímida, fechada e sofre abusos do próprio avô (que dizem que na verdade é o seu pai), acaba sendo abusada por Cícero que com uma arma força a menina ao sexo. Tudo muito cru e com destino cruel pra todos os personagens da trama.

Misoginia

O roteiro de Hilton Lacerda - o mesmo de Baile Perfumado, Amarelo Manga e Árido Movie -, a direção de Cláudio Assis e os atores fenomenais fizeram de Baixio das Bestas um filme premiado em festivais em Paris, Rotterdam e Brasília. A fotografia belíssima que mistura o árido, seco com os verdes campos de cana de açúcar são outro destaque do filme.

Bela fotografia

Baixio das Bestas choca porque se propõe a isso desde a primeira cena que mostra o avô despindo a neta no fundo de um posto de gasolina. Não é um filme fácil. Dá nojo de cada um dos personagens. O de Matheus Nachtergaele em determinado momento, quebra a quarta parede e diz olhando pra câmera: "no cinema tu pode fazer o que queres." A misoginia explícita em vários momentos rebaixa Baixio das Bestas a um filme que poderia ir além sem ir tão fundo.

"No cinema tu pode fazer o que tu queres"
Mas como o intuito é chocar vale então enfiar cabo de vassoura no ânus da prostituta... vale ver a neta tocada por caminhoneiros imundos... vale chutar a cabeça da mulher que se negou ao prazer anal. Mas agora sem ironia... será que vale mesmo? De qualquer forma vale como retrato da realidade que escancara e ela nem sempre é doce como cana de açúcar.  
Veja abaixo o trailer de Baixio das Bestas.

domingo, 1 de abril de 2018

SPARTACUS (1960)

O olhar desafiador do escravo

SPARTACUS (1960) - Grandiosidade. Quando se junta Stanley Kubrick, Dalton Trumbo e Kirk Douglas não dá para se esperar outra coisa. O projeto para lá de ambicioso foi todo produzido na década de cinquenta e tem mesmo um pé naquela época, mas só foi lançado no comecinho da década seguinte. Foi ignorado nos principais prêmios da Academia, levou um de ator coadjuvante, figurino, fotografia e direção de arte. Levou também o Globo de Ouro de melhor filme dramático. E só. Merecia mais.

Escravo de destaque

Spartacus é um escravo do Império Romano. Trabalha dia e noite junto com outros tantos. Mas ele tem algo a mais. Não leva desaforo dos guardas romanos, está sempre com aquele olhar desafiador e não dá à eles o prazer do grito, do choro de dor. Se destaca e por isso mesmo acaba sendo vendido para um treinador de gladiadores, junto com outros tantos.

Uma verdadeira arma de guerra

E passa a lutar com outros escravos até a morte em uma pequena arena. A alta casta de Roma assiste a tudo lá de cima e vibra como uma partida de futebol. Em uma dessas lutas, logo em sua primeira, Spartacus é derrotado. Mas no momento em que será morto, o escravo vencedor se revolta e joga o tridente - arma que usa no combate - contra os romanos. Tenta pular a grade e acertá-los pessoalmente, mas logo é impedido e morto pelos guardas.

A luta pela vida

Spartacus, então se transforma em um grande líder dos demais escravos. E lidera uma rebelião, onde todos escapam e fogem pro campo. Lá montam uma pequena cidade com suas mulheres e crianças e aos poucos a vida começa a caminhar para os escravos, pela primeira vez livres. Mas Spartacus não descuida de seguir treinando os seus companheiros, já que ele acredita que um contra-ataque do Império Romano é eminente.

Kubrick no set

Dito e feito. Mas antes... Intermission. É, Spartacus é um filme longo, tem quase três horas e vinte, e por isso, como era costume nos grandes épicos daquela época, o filme tinha uma interrupção no meio, onde a plateia podia levantar, tomar uma água e só depois de alguns minutos o filme era retomado. Seguindo Seguindo com o filme.

O senado romano

Nessa segunda parte, o Império Romano acaba por achar o paradeiro dos escravos. Eles querem saber qual dos homens ali é Spartacus, ninguém se pronuncia. Então eles vão crucificando um por um os escravos para que todos que passem vejam o que acontece com quem desobedece o Império Romano. Por fim, Spartacus e Antoninus, que se tornaram grandes amigos naquela jornada, são os que sobram e devem duelar até a morte, o outro será crucificado.

Cenários grandiosos


O sucesso foi estrondoso. Custou meros doze milhões de dólares e arrecadou sessenta. Kubrick, que sempre traz uma assinatura muito própria em cada um dos seus longas, entrega um Spartacus sem as suas grandes marcas próprias. E isso tem uma explicação - Anthony Mann começou a rodar o filme, mas desentendimentos com Kirk Douglas fizerem com que ele fosse substituído por Kubrick, que já havia trabalhado com Kirk recentemente em Glória Feita de Sangue.

De escravo à líder

Veja abaixo o trailer de Spartacus.