PÂNICO NA NEVE (Frozen / 2010) - Adam Green não é um nome conhecido no cinema. Está beirando os quarenta anos e se entrega à direção de filmes do gênero terror/suspense desde o começo da carreira. Os seus filmes, por não terem astros envolvidos ou grande orçamento são filmes B, o que acaba ajudando pro gênero de filme que ele geralmente escolhe fazer. Seu maior sucesso é Terror no Pântano que acabou ganhando até uma sequência (virou até uma trilogia, mas o último não dirigido por Green).
Adam Green, de preto, em ação
Pânico na Neve é um filme de roteiro simples mas que entrega exatamente o que promete em seus pouco mais de 90 minutos. Dois amigos e a namorada de um deles estão numa estação de esqui lotada num domingo a tarde. Pegam o teleférico até o alto da montanha e descem curtindo a neve que cai à toda. No final do dia, quase noite, eles tentam subir uma última vez antes de voltarem por hotel. Convencem o funcionário do teleférico que deixa os três subirem no banquinho do teleférico. Após uma troca de turno e uma confusão de informação a estação de esqui é fechada, as luzes apagadas e os três são esquecidos no alto do teleférico, há 15 metros de altura.
O início de uma subida desastrosa
Nada mais precisa se saber, isso é tudo para se criara terror bastante, mas as coisas só pioram. A estação só abre ao final de semana, então eles ficarão presos ali de domingo até a outra sexta, é a morte certa. O que fazer?
O que fazer para tornar a história excitante?
Precisa de algo mais para se criar um roteiro interessante? Por si só a história já garante surpresas daí até o fim. Caso não queria saber o que acontece na sequência não leia os próximos parágrafos.
OS PRÓXIMOS PARÁGRAFOS CONTÉM SPOILERS
Depois de algumas horas ali, a nevasca aumentando, um dos caras desiste pular para pedir ajuda. Mas de 15 metros de altura não há melhor coisa a vislumbrar - na queda ele tem fratura exposta, quebra as duas pernas e grita alto. Seus gritos chamam a atenção de lobos da montanha que aparecem e o comem vivo. O terror está instaurado.
Os inimigos estão soltos
Fome, frio, pele congelando e o terror de lobos à espreita fazem a situação só piorar. O outro cara decide fazer algo a respeito. Sobe nos cabos do teleférico e decide ir até um dos postes de sustentação que tem escadas. Ele chega até lá com as mãos sangrando e desce. Não há lobos e o cara pega um ski e começa a descer a montanha. De repente lobos aparecem e o seguem vorazes.
Saída? Por onde?
A menina fica sozinha no teleférico. Não sabe quanto tempo passou. A cadeirinha do teleférico começa a balançar, está se soltando devido ao peso exagerado por tanto tempo. Lá embaixo não há lobos. A menina consegue se pendurar e acaba se jogando. Como a nevasca durou a noite inteira, o chão está fofo e amortece a queda da menina. Para não chamar atenção dos lobos ela começa a rastejar, descendo a montanha aos poucos.
Chegando lá embaixo...
Lá embaixo encontra com os restos mortais do amigo, totalmente despedaçado e sendo devorado pelos lobos. Ela não faz barulho, mas é notada pelos lobos, que ainda tendo um banquete pela frente ignoram a menina que passa direto sem problemas. Chega ao pé da montanha, onde é resgatada por um cara de carro. Fim do filme.
FIM DOS SPOILERS
Pânico na Neve funciona sim como divertimento descompromissado. O roteiro tem boas saídas e é enxuto, o que torna a experiência ainda melhor. Sem enrolação para entrar na ação principal e sem enrolação quando a história termina. Pode-se discordar de uma saída ou outra do roteiro mas o filme funciona sim. Boas escolhas de Adam Green em mais um bom filme de terror B.
SÓ DEUS PERDOA (Only God Forgives / 2013) - Quando um diretor deixa de ser novato? Não é pela idade ou mesmo pela quantidade de filmes. Talvez um dos fatores seja o amadurecimento a cada filme. Dessa forma, dá para afirmar sem medo que o dinamarquês Nicolas Winding Refn está pisando firma rumo a uma carreira sólida e premiada na cadeira de direção. A cada filme Refn ganha mais confiança em seu texto, na criação dos seus personagens e cria uma linguagem quase própria para contar as suas histórias. Isso só mostra que ele sim, ganha a cada filme, um status maior.
Refn em ação; a cada filme uma carreira mais sólida
Depois do excelente Drive de 2011, Refn retoma a parceria com Ryan Gosling e entrega este Só Deus Perdoa, um roteiro seu e não baseado em um livro, no caso de Drive. Em Só Deus Perdoa, Ryan vive Julian, um traficante que usa a sua academia de Muay Thai, na periferia de Bangkok, como fachada para as suas negociações ilícitas.
Gosling pronto para a luta
Tudo começa a se complicar quando o irmão de Julian mata uma prostituta. Chang, usa roupa de policial aposentado, mas não é bem um policial, é quase uma força do mal ou do bem, está em todos os lugares, sempre com a mesma roupa, com gestos contidos, é um justiceiro muito impiedoso. Trás o pai da prostituta assassinada para a cena do crime e este mata o irmão de Julian. Depois Chang corta o seu antebraço.
Chang não é o herói, nem o vilão, parece estar muito acima de tudo isso
Julian não se vinga do assassino do seu irmão, o deixa ir embora. Sua mãe, Crystal, vem dos Estados Unidos atrás do corpo do filho. Ela tem uma relação estranha com Julian, é dominadora, mas tem com ele uns carinhos estranhos. Não é bem uma mãe, mas uma amante dominadora. Crystal contrata uns caras para perseguir o cara que matou seu filho. Chegam até Chang que, usando de muita violência elimina um a um, sempre com proteção policial em volta, embora nunca precise.
Justiça com a própria espada
Os caminhos de Julian e Chang se cruzam num embate na academia. Julian tenta de todas as formas acertar um soco mas Chang desvia de todos e só usando o contra ataque acaba com Julian que fica desfigurado no chão. A técnica de Chang é impressionante, ele nem sua ao lutar, aumentando ainda mais as suspeitas de que Chang talvez não seja humano. Será? "Vamos conhecer o diabo", um dos personagens diz logo no começo da trama.
Quase mudo no filme, Gosling tem dificuldade de se relacionar, aos poucos sabemos porque
O PRÓXIMO PARÁGRAFO TEM SPOILERS
Julian se mostra arrependido de tudo o que fez e evita levar em frente a sua vingança, ao evitar que a filha do mesmo seja morta. Na mesma sequência, Chang degola Crystal, sem dizer uma só palavra. Julian se entrega a Chang, dando seus punhos para que sejam cortados. No momento final, Chang aparece num bar de policiais cantando num karaokê e ali, ainda em choque, se vê os créditos finais.
A estranhas sequências no karaokê, quase um rito religioso
FIM DOS SPOILERS
Muito se fala em Chang como o próprio diabo, alguns apostam que ele é Deus, que aparece no título. Tudo o que ele faz no filme é matar as pessoas de formas impiedosas, torturando-as até, mas todos que morreram são os vilões da história, nenhum mocinho. Até último caso, o filme fala de policiais agindo duro para limpar a periferia de Bangkok do crime. E quem pode dizer o contrário?
Deus? Diabo? Chang...
Não é um filme fácil, a violência é extrema e a linguagem de Refn torna tudo ainda mais perturbador. Larry Smith foi o cara escolhido para fotografar o filme, o mesmo de De Olhos Bem Fechados, isso explica porque tanto de Kubrick se vê em Só Deus Perdoa. Os corredores sem fim, os planos simétricos, a iluminação com um azul e um vermelho muito exagerado, tudo aqui é muito Stanley Kubrick. Refn bebe na fonte certa.
A simetria nos planos, muito de Kubrick aqui
O filme é enxuto, escuro e muito silencioso, Ryan Gosling, o astro do filme, tem apenas 17 falas. E tem que ser assistido muitas vezes. Não é de primeira que se gosta ou se odeia esse filme, acredite. Ou você gosta mais com o tempo ou tem certeza que o odeia. Mas nunca julgue da primeira vez. É um filme para ser revisto e com atenção aos detalhes. E são muitos.
A "luta", o ápice de um filme lento e silencioso mas com propósito
O Lobo de Wall Street marca a quinta participação de Leonardo DiCaprio em filme de Scorsese e para mim junta um ótimo diretor que já foi brilhante e hoje faz apenas bons filmes e nada mais, com um ator que nunca foi nem será um gênio da atuação mas também não é de todo ruim. Um ator morno com bons momentos e um diretor com passado irretocável mas com um presente de péssimas escolhas. Esse é o retrato de O Lobo de Wall Street.
O diretor nova iorquino e seu ator-fetiche
A história é baseada no livro de mesmo nome de Jordan Belfort contando a sua vida como corretor da bolsa em Wall Street. Tudo começa com Jordan pobretão mas com um talento incomum para vendas e um ambição maior ainda. Rapidamente ele abre um negócio próprio com alguns amigos, incluindo Donnie (vivido pelo ótimo, cada vez melhor, Jonah Hill), e começa a subir na carreira ganhando cada vez mais dinheiro.
Jonah Hill e Leonardo DiCaprio
A subida de Jordan na vida é muito rápida, em menos de 5 anos ele transforma sua empresa em uma das grandes do ramo da corretagem. A cada conquista na carreira ele e seus amigos "comemoram" com drogas e prostitutas, dentro do próprio escritório. Uma constante. A todo momento. Muito sexo e drogas.
Muita farra em uma vida inconsequente
Tamanha subida só pode resultar numa queda certa. O FBI investiga passa a passo da empresa e prende um a um os caras no final. Não estou aqui estragando nada na história, afinal é mais do que óbvio que essa queda viria a qualquer momento. Aliás o roteiro não poderia ser mais fraco. É muito previsível, por mais que o livro conte a ascensão e queda de Jordan, caberia ao roteiro dar uma bagunçada na história, tornar o filme mais atraente, mas não nada disso foi feito. É uma pena.
No topo do mundo e prestes a cair
Não tem como um filme desse ser ruim, mas também não é bom, no máximo recebe um OK. O destaque não é Scorsese, que se esconde atrás da cadeira de direção e entrega passivelmente um filme ou de DiCaprio que não faz nada que um personagem exagerado peça. O grande destaque vai para Jonah Hill. Vindo da comédia, ele emplacou alguns dramas, se mostrou versátil e em O Lobo de Wall Street tem o seu grande momento. Digno de Oscar? Talvez seja muito para ele, mas que Hill é definitivamente o destaque do filme, talvez o único, isso ele é.
GRAVIDADE (Gravity / 2013) - Claustrofobia, labirintite, tonturas. Durante os poucos mais de 90 minutos de exibição é normal exibir alguns desses sintomas. Ou todos eles. Se quiser evitar, simplesmente ão assista Gravidade nos cinemas. Ainda mais se for aqueles de tela gigante. Mas já aviso - assistir esse filme na TV de casa perde 50% da graça, da diversão ou dos sentimentos pretendidos pelo competente Alfonso Cuarón.
Cuarón dirigindo Bullock e Clooney
O diretor mexicano, um dos alicerces do cinema latino americano ao lado dos amigos Alejandro González Iñarritú e Guillermo del Toro, já havia entregado o impressionante Filhos da Esperança em 2006 e agora, sete anos depois ele vem com esse Gravidade. O resultado dessa "demora" entre os longas é vista nas telas - um cuidado muito grande na finalização e um apresso aos detalhes, resultando em obras sempre muito bem acabadas.
Bullock no set de Gravidade
Gravidade é um filme enxuto, conciso e muito eficiente. Mostrou tudo o que precisava, não perdeu tempo com histórias paralelas ou dramas desnecessários. São apenas dois atores em ação, Sandra Bullock e George Clooney, os outros 5, se tanto, aparecem apenas em voz, não os vemos.
Bullock e Clooney no espaço
Logo de cara estamos flutuando no espaço, do lado de fora da espaçonave americana acompanhando o procedimento de Ryan Stone (Bullock) que tenta concertar algo na nave, ela está em sua primeira missão no espaço. Dando voltas ao redor da nave com seus pequenos motores propulsores vemos Matt Kowalski (Clooney), um experiente astronauta que participa da sua última missão antes da aposentadoria. É óbvio que tem tudo para dar merda. E dá.
"Tem algo vindo lá e não é nada bom..."
Eles são avisados por Houston (voz de Ed Harris) a voltar imediatamente para o interior da espaçonave porque em sua direção estão vindo destroços de uma espaçonave russa que havia se chocado com um asteroide. Não conseguem entrar a tempo e pela força dos destroços são jogados a deriva no espaço, Kowalski ainda consegue se segurar, mas Stone passa a voar para mais e mais longe da nave perdendo todo e qualquer contato visual com Kowalski.
Destroços atingem a nave
Depois de angustiantes minutos eles se reencontram, ele a busca com seus motores propulsores e agora sem espaçonave, já que a sua havia sido destruída após os choques com os destroços, eles tentam encontrar outra espaçonave que está por ali, a Estação Internacional ou a Chinesa.
Stone à deriva no espaço
OS PRÓXIMOS PARÁGRAFOS CONTÉM SPOILERS
Outros destroços estão a caminho e em uma sequência de tirar o fôlego, Stone consegue se segurar em cabos presos à nave e segura Kowalski com o cinto de segurança. Sabendo estar sem saída e para não comprometer a pouca chance de sobrevivência que tem, ele se solta para à morte nos confins do espaço. Stone tem que sobreviver por sua conta agora.
O visual impressiona
Ele chega à estação chinesa, através de uma das células da sua própria espaçonave e lá perde os sentidos, ao desistir da sua volta à Terra e desligando o oxigênio lá dentro. Kowalski reaparece e entra com ela na célula chinesa, conta uma histórias que a animam e até nos faz imaginar que talvez ele realmente tenha conseguido sobreviver. Ledo engano. Pouco depois ele desparece e ela acorda para a sua existência, religa o oxigênio e decide fazer de tudo para voltar à Terra.
Por conta própria em sua primeira missão fora da Terra
FIM DOS SPOILERS
Gravidade é um tiro incerto à princípio, mas cheio de acertos por Cuarón. Muito graças às suas escolhas de evitar histórias paralelas, fazer um filme curto e com poucos personagens. Não à toa ganhou o Globo de Ouro de melhor direção e concorre em 10 categorias do Oscar, como Melhor Filme, Melhor Direção e Melhor Atriz, o resto é tudo premiação técnica. E nem poderia ser diferente, Gravidade é um show de técnica e efeitos bem encaixados. Vale cada minuto. Impressionante em cada segundo.