quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

A GAROTA DINAMARQUESA (2015)

Uma mulher à frente do seu tempo

A GAROTA DINAMARQUESA (The Danish Girl / 2015) - "Este inglezinho aí é um zé ninguém, vai assistir o Oscar de camarote e nada mais", pensava eu quando me deparei com a lista de indicados à premiação no início de 2015. Assisti ao tal "A Teoria de Tudo" e achei melhor ficar quieto. Eddie Redmayne foi impressionante no papel de Stephen Hawking e mereceu cada grama do pesado Oscar de melhor ator. Calou minha boca.

Eddie Redmayne e seu Oscar por A Teoria de Tudo

E eis que me deparo de novo com Redmayne sendo indicado ao Oscar de melhor ator, desta vez por A Garota Dinamarquesa, na qual ele interpreta a tal mulher do título. Mais uma vez me banho de preconceitos - "duas vezes seguidas não dá, né? ainda mais esse cara! ele é muito jovem, vai ter tantas e tantas chances" e blá-blá-blá. Assisto o tal A Garota Dinamarquesa e mais uma vez calo a boca. É melhor não desconfiar mais do talento de Eddie Redmayne.

A transformação de um ator

A história se passa no final dos anos 20 e começo dos anos 30 em Copenhaguen. Eniar (Redmayne) e Gerda (a ótima Alicia Vikander), são casados há 6 anos, tentam engravidar com frequência - sem sucesso -, enquanto encaram o desafio da vida da arte. Ambos são pintores - ele de paisagens e ela de retratos. O talento dele se destaca, ela ainda dá os primeiros passos no que pode ser um carreira de sucesso.

O casal de pintores

Eniar odeia a vida social. Gerda, então, propõe uma brincadeira - pede que ele se vista de mulher para ir a uma festa. Eniar assume então o nome de Lili. À princípio tudo é divertido. Gerda observa de longe enquanto Eniar encara com perfeição os trejeitos de uma mulher delicada e nada caricatural. Tudo é tão bem feito que os homens da festa começam a flertar com Eniar, ops desculpe, com Lili. Um desses - mais assadinho - desfere um beijo em Lili, que não nega e retribui. Gerda de longe, vê tudo.

Lili sendo seduzida por um homem

Tudo fica confuso na cabeça de Eniar e ele passa a se encontrar com o homem em segredo, assumindo a identidade de Lili. Ele se afasta cada vez mais da esposa e acaba revelando pra ela que já esteve com outros homens, anos atrás. O que mais lhe marcou foi Hans, um amigo de infância.

O amigo que ajuda a mudar a vida de Eniar/Lili

Eniar não sabe mais ser Eniar, mas ao mesmo tempo tem vergonha de assumir ser Lili integralmente, então procura ajuda médica. Gerda acompanha tudo de perto, agora ela já é mais amiga do que esposa. O veredito dos médicos é quase sempre o mesmo - esquizofrenia.

A leveza na interpretação

Hans sugere que Eniar procure um doutor na Alemanha com uma ideia inovadora e pouca experimentada - a operação de mudança de sexo. Lili é mais forte que Eniar, que aos poucos deixa de existir. Ela decide tentar a qualquer custo a tal operação. Seria uma das primeiras vezes na história que a tal operação seria feita.

Logo após uma das cirurgias, Lili recebe Gerda

O filme é baseado em uma história real e foi contado pela própria Lili em sua autobiografia lançada na década de 30. Tom Hooper, que levou o Oscar de melhor diretor por O Discurso do Rei, dirige A Garota Dinamarquesa de uma forma burocrática, eu diria. É um filme linear, sem riscos e portanto - de uma certa maneira - fácil de ser assistido. Eu esperava algo mais desafiador, até mesmo corajoso - como fora a atitude de Lili naqueles tempos -, como os problemas que ela enfrentava nas ruas (e não apenas uma ceninha isolada), como Lili era vista pela sociedade na década de 30, o que falavam dela (é um paralelo importante que poderia ser traçado, até mesmo para compararmos com que se vê hoje), e os dramas enfrentados dentro de casa... e tantas outras coisas. Ao invés de levantar essas questões, Hooper prefere entregar uma obra previsível e totalmente apoiada - para não dizer "somente apoiada" - nas atuações, o ponte forte da trama. Faltou ousadia.

Faltou ao filme a ousadia que sobrou em Lili

Alicia surpreende muito e concorre ao Oscar de melhor atriz coadjuvante no papel da esposa que perde o marido e se transforma no grande apoio moral que Lili precisa para seguir vivendo. Ela é o grande par que Redmayne buscava desde A Teoria de Tudo (desculpe Felicity Jones, você não passa de um rostinho bonito). Alicia é escada e faz frente, construindo um personagem forte, destemido, uma mulher à frente da sua época.

Alicia Vikander e uma interpretação notável

Redmayne surpreende não apenas pela caracterização, mas por trabalhar em Lili como uma mulher realmente e não como se fosse um homem interpretando um mulher. Isso faz toda diferença. Ele respeita a história da personagem e confere a cada gestual um trejeito delicado e fino, que só uma mulher seria tão habilmente capaz de construir. Redmayne, que era visto como uma promessa - até mesmo depois de levar o Oscar por A Teoria de Tudo - já se tornou uma realidade. Um grande ator, que precisa ser respeitado. Aprendi essa lição.

A Lili real e a Lili do cinema

Veja abaixo o trailer de A Garota Dinamarquesa.





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